segunda-feira, 30 de agosto de 2010

RESUMO (20 - Último)

Este é último dos "capítulos" de RESUMO, tal como o encontrei, no qual fiz apenas a verificação ortográfica, com correcção de algumas falhas.

Segundo me parece terá sido escrito, directamente no portátil, para além de Agosto de 2009 e quando este pifou, já com dificuldades de locomoção.

Os escritos que encontrei estão nos caderninhos, sobre os quais irei "ruminar" como diz o Jorge e depois, talvez, publicar.

Então aqui vai o último:

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JUNTA-MEDICA


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No dia 30 de Junho sou chamada á junta médica da Administração Regional de Saúde. Ninguém me informara – talvez seja tabu ou grande segredo— que os doentes oncológicos podem ter benefícios fiscais. Fui então contar a minha história perante um simpático médico. Apesar de esta lei estar pensada, e seja positiva somente a sua existência, devia ser talvez revista. O que pude aproveitar até ao momento foi o facto de não pagar o imposto de circulação do meu veículo automóvel, e a devolução de um ano de IRS, já que tendo sido trabalhadora independente, acabei por perder o trabalho, os contactos, e não tenho rendimentos que me permitam a sobrevivência. Vivo literalmente às custas de meus pais.

Mas esta entrevista correu bem, cheia de informação, com muito civismo e continuo a dizer, com um profissional médico á altura do cargo que exercia: uma pessoa, boa, sensível e útil.

E nesta mesma semana recebo o maravilhoso apoio da baixa: 68,32€. Na cega e estúpida tentativa de atingir o mínimo de 15 anos de descontos (nesta altura tinha somente 13 anos a caminhar para 14) eu continuava a pagar as minhas contribuições para a Segurança Social, excepto os dias do tratamento. No momento em que escrevo, já fechei actividade, de tão caro me estava começar a sair da bolsa, e estou a tentar pedir a pensão por invalidez. Isto esperando que o meu hospital e a supra citada entidade se entendam quanto ao modelo de relatório clínico que devo entregar. Espero conseguir tratar disto antes de morrer, ufa!

Entre estadias na cidade e no campo, tenho uma consulta marcada em 22 de Julho, com direito a análises e TAC de rotina.

Uma ínfima réstia de liberdade aproxima-se de mim.

Por enquanto não faço mais quimioterapia. A minha alegria multiplicava-se á do meu médico. Ele dizia-me isto, mas continuava com a cara séria. Eu tinha dois nódulos no pulmão, mas a ifosfamida estava a fazer estragos. Iria ficar em observação. Isso equivalia a ficar em stand-by até perto de Novembro.

Durante o vai-não vai, acabei por encontrar varias amigas e conhecidos naquelas voltinhas de shopping. Fiquei super feliz por não ter de ficar lá novamente, naquela enfermaria. Mas logo fui remetida ao quintal. Nesta altura, faleceu Randy Pausch, que conseguiu lutar além do mês que lhe deram. Randy, professor universitário americano, decidiu incluir nos seus dias “The Lecture”. A lição que se calhar foi a mais valiosa da sua vida, pelo menos na minha opinião. Explicou tudo o que se passava consigo aos seus alunos, de modo científico, mas acessível. De acordo com a medicina, era suposto ele ter sucumbido ao cancro seis meses antes. No tempo que teve a mais, graças á sua força e árduas sessões de tratamentos que ele narrava no seu diário, optou por deixar o relato para os seus filhotes praticamente bebés, e para todos os outros que quisessem saber. Já tive o link neste blogue, mas entretanto, como sou uma “expert” no assunto, a coisa correu mal. Mas penso que procurando o nome dele seja possível obter informação, embora em inglês. Randy faleceu em 26 de Julho de 2008, na semana em que fui libertada parcialmente do IPO.

Na semana seguinte passou a entrevista do nosso Salvador Vaz da Silva na SICMulher.

Tive a minha junta médica para efeitos de benefícios fiscais, que correu muito bem, dando continuação a tudo o que escrevi antes: simpatia, civismo e respeito das pessoas que estavam a trabalhar, e não a maldita pena!

Mas voltei para o quintal. Ora o que se faz com um quintal em Agosto? Mandam-se candidaturas on-line para voltar a trabalhar. Eu recomeçara a enviar currículos por correio normal desde fins de Abril, sem saber porquê, na tentativa de afastar a doença, deixando que vingasse a parte sã do meu metabolismo. Agora, sem recursos alguns além de um portátil com acesso á internet por placa com pouca rede, ia tentando tratar da minha vida. O ano lectivo iria recomeçar em Setembro. Nessa altura do ano é um verdadeiro corrupio de caça aos formadores e, sabendo eu disso, não podia ficar de braços cruzados. Os meus pais só me queriam ver a descansar, se bem que o meu pai se mostrava mais consciente da minha pequenina e inglória luta em recuperar trabalho.

Na primeira semana de Agosto recebi, por correio normal, o meu Atestado Multi-Usos, com incapacidade de 80%. Por um lado, pode dar jeito, por outro, é novamente um daqueles momentos em que nos reportamos á legislação e…fazendo o cruzamento, descobrimos que estamos mais para lá do que para cá. Mas arranjei que fazer, pois foi necessário voltar a entregar declarações antigas do IRS (a do ano anterior). Isso fez-me ir á Repartição de Finanças três vezes, e pobres senhores funcionários sempre a pedir desculpa. É assim que resulta. Toda a alteração foi canalizada para o sistema central em Lisboa, pelo que ia tendo várias coisas para provar, uma de cada vez, na Repartição. Mas tudo se arranjou, pelo menos no meu caso. Imagino, agora que escrevo e pouco consigo movimentar-me, que não teria achado graça nenhuma ao assunto se isso se passasse agora.

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É tudo por agora. Depois da "ruminações", talvez volte com outros escritos.

O pai Bártolo

7 comentários:

Natália Fera disse...

olá Pai Bártolo
Mais uma vez um belo apontamento escrito pela sua filha.
Continuamos a estar mal informados a respeito dos beneficios que podemos ter,acho mesmo que conforme nos explicam sobre a doença e outras coisas que se vão passar a nivel de tratamentos e de outras alterações na nossa vida,também haviam de nos explicar os beneficios ou então terem uns panfletos com tudo bem explicado.
Bem,mas isso se calhar também não lhes convém nem lhes interessa muito
que a gente saiba.

Beijinhos e uma boa semana.

O Baú do Xekim disse...

Olá Bártolo.

Continuação de boa semana.

Um abraço.

manuela baptista disse...

Olá Pai Bártolo

tenho andado calada

mas para ler não é preciso fazer barulho pois não?

não deixo de passar sempre por aqui!

um abraço

Manuela

Anónimo disse...

Olá Natália
Pois, se calhar não sabem informar e não se importam em saber. É exemplo disso o que eu passei para obter autorização para fornecimento do oxigènio liquido. Não sabiam, não procuraram, tentaram dificultar inventando obstáculos onde não os havia... Enfim, consegui vencê-los, mas não a tempo de poder fazer o que queria:"levar uma última vez a Susana ao "quintal""...
Olá Joaquim
Boa semana também para si
Beijinhos e abraços
O pai Bártolo

Anónimo disse...

Olá Manuela
Eu sei que anda por aqui. Eu também o faço, entro e saio de mansinho, sem que nada diga, muitas vezes por não saber o que dizer, mas vou continuar.
Amanhã vamos até à outra cidade e ao "quintal" para tratar de assuntos oficiais. Não sei se lá terei sinal.
Se não aparecer já sabem. A TMN não investe naquela zona...
Beijinhos
O pai Bártolo

Branca disse...

Passo para deixar um beijinho e volto amanhã para ler.
Não me esqueço de vós.
Boa viagem até ao quintal.
Tia Branca

Anónimo disse...

Olá Tia
Muito obrigado por nos acompanhar.
Já regressamos à praia depois de um dia muito cansativo em Coimbra, mas não quis deixar de vir aqui...
Beijinhos
O pai Bártolo