sexta-feira, 3 de julho de 2009

Pensamentos amarfanhados...e passados

Caros amigos, tudo isto me passou pela cabeça.

Como não conseguia sentar-me para usar o pc, fui escrevendo num caderno. Agora partilho convosco.


Hoje terminei as três semanas de radioterapia á coluna. Caminho melhor, e isto ainda vai melhorar mais, juntamente com o protocolo de quimio que me espera.


Este susto foi muito grande, mas não sei se é só por ser mais um. Quando vem uma má notícia, parece ser sempre pior que todas as outras. Pensava que me ia habituando, mas continuo a resistir a isso.


Devo dizer que me sinto muito bem hoje, com esperança. Deve ter sido de bater no chão, hi hi.

Tenho saudades do quintal dos meus pais. A foto é do Rex e Miquelina, com sua prole de 9 gansos na semana em que nasceram. Acreditem em mim...agora metem respeito, estão enoooormes!


Beijinhos



28 de Junho 2009

“Toma lá, escolhe tu.”
Escolher – palavra de conceito interessante. É algo que não faço desde Dezembro de 2006, desde exactamente o dia 12. Os planos que eu tinha para ver os meus pais felizes e descansados, gozando a sua reforma, tendo / conservando / criando novos amigos, foram por água abaixo.
Estou dependente deles. Imagino que, por trás dos sorrisos que me dão ás centenas cada dia que passa, está o sofrimento e consciência de que a filha única não vai durar muito. Eu acho que eles têm essa consciência, mas respeito o facto de não quererem falar disso. Eu também não quero, prefiro simplesmente pensar. Hoje é assim, amanhã logo vejo.
Pode ser que descubram qualquer coisa que mate o meu sarcoma sinovial monofásico fusiforme (ou fusicelular, conforme a escola de medicina). Entretanto vou andando.
Fiz de conta que era uma pessoa normal enquanto trabalhei e paguei os meus impostos. Tentei, e cortei (á força) o cordão umbilical bastante tarde.
Queria que os meus pais tivessem outros objectivos além de mim. Eu só queria viver a minha vida, sem ninguém á volta. Queria que qualquer escolha de companheiro não estivesse condicionada pelo resto da família, queria fazê-la livremente. No momento em que cortei o cordão não tinha ninguém nem tive durante anos.
Veio o enfarte do meu pai (no qual eu julgo ter tido muita culpa, ele é muito emocional, embora não o demonstre) e tudo o resto de seguida.
Haverá ligação? Serão ou poderão ser as causas meramente celulares/genéticas ou assim do género? Ou poderão estes males ter origem emocional?
Pois já sei, há milhões e milhões de pessoas a indagar-se acerca do mesmo.
Neste momento tenho quatro médicos a tratar de mim directamente e da minha “agenda”.
Os meus pais vivem em função de mim. Sou uma lapa que nunca quis ser. Diz o senso comum que ser pai/mãe é mesmo assim. Espero que seja, para que não lhes custe tanto. Eu cá não sei o que é ser mãe, nunca fui, com imensa pena, pois desejava nada mais, nada menos do que três rapazolas. Agora entrei oficialmente na menopausa, com toda a quimio que fiz até agora. A que está prevista para breve será a terceira, pode ser que “seja de vez”.
Gostava de recuperar os meus movimentos, pelo menos para fazer algo e não ser um peso tão grande na rotina da casa.
A casa dos meus pais lá está, vazia, como se tivesse sido abandonada. Arrumadinha, mas sem as almas lá dentro. A da praia…não tem uso, nem projecto de vir a ser utilizada. Tenho de fazer algo quanto a isso. E até o raio da bicicleta eu me lembrei de levar para lá. Talvez a ofereça a alguém, tal como a viola e a raquete. Coisas que fiz, mas que não voltarei a fazer quase de certeza, pois implicam força e habilidades que já não tenho.
Agora vou caminhar pela casa. Depois volto. Joka.


29 de Junho 2009

Afinal não voltei ontem.
Hoje foi um dia estranho.
Passei-o quase todo no IPO. Sendo eu (a minha coluna) um caso urgente, e aproveitando o facto de estar já lá a fazer a reparação da L5, acharam por bem os meus queridos médicos continuar já com a reparação da “D3 e margem”.
Assim, fomos para lá ao toque de aviso da doce Doutora da Radioterapia, chegámos, sentámo-nos á espera da minha vez de ir ao simulador. Desta vez era necessário, bem como mais tatuagens. Já tenho três colecções de tatoos, uma de 2007, feita para atacar o mediastino e não chegou a ser usada; a série para a L5 e hoje, fresquinhas, a série para a D3.
Bem, eu a ver que os meus papis iam desfalecer com fome e eu, em frente a um LCD sem som, a tentar descortinar o que se passava no programa da quatro, cheia de sono. Acabou o programa, começaram as notícias e, por volta das 13h40m chamaram-me. A equipa estava exausta. Eu era a última de um grupo de doentes que começava hoje tratamento. Notava-se porque as caras conhecidas resumiram-se a 3 ou 4 durante toda a manhã. (Começamos a ter colegas, é giro).
Lá fui, tirei a roupa, pois já sabia o que me esperava: as marcações. Nada de minhoquices, para a frente que atrás vem gente! Lá se fez o que era necessário, ganhei mais umas pintas no peito, com as quais pouco me importo. Fazem-me lembrar algo do género “Amor de Mãe”, aquelas do ultramar, mas com muito mais pinta.
Fomos os três almoçar a correr, quero dizer, eu fui tipo caracol-de-corrida. Mas consegui ir a pé até ao bar, depois pelo elevador para o piso 1, e daí subi pequena rampa e escadas…lá fui fazer o hemograma.
Voltámos para a Radioterapia e daí a pouco chamaram-me. As sessões vão ser no mesmo horário das duas últimas semanas, foram simpáticos. Desta vez terei o trabalho de tirar e vestir a parte superior da roupa que levar. As “batas” têm todas o velcro avariado e provavelmente vou ter alguma situação semi-embaraçosa, que espero dê para rir.
Como são só cinco sessões a 20 Gy, e os raios são emitidos de lado oblíquo e por trás, estou a contar não ter efeitos secundários maus, como esofagite e afins.
Para já, fui ali mudar o penso de morfina, o que faço de quatro em quatro, isto é, tecnicamente a cada três dias e meio, segunda á noite e sexta de manhã, sistema transdérmico que liberta 52,5 microgramas /hora.
Estou ligada a opiáceos e morfinóides. Se me falta algum destes medicamentos a coisa volta a ser brava.
Até lá tenho de ter cuidado com as minhas vértebras. Vou ter aqui “trabalho” para muito tempo.
Tenho de perguntar ao Xico como é que se faz quando temos de fazer xixi e a vontade não activa o sistema de expulsão. Ele já passou por tanta coisa (é colega), que lá terá os truques dele.
Para já, nada de coisas nem muito quentes, nem muito frias pelo esófago abaixo.
Amanhã é outro dia…dizem.


30 de Junho 2009

Olá…não sei a quem estou a dizer “olá”.
Hoje a minha mãezita parece cansada outra vez. É natural que se sinta assim: já acordou, cedo, depois de mais uma das suas noites dormidas a prestações. Não descansa nada de noite, e quando acorda é para ouvir, no silêncio da noite, se eu respiro, ressono, se estou a virar-me na cama, se… se… se…
A esta hora já me ajudou a tomar duche. Preciso de ajuda por não ter o equilíbrio a 100% (será que volta?), e não consigo dobrar-me de modo a poder esfregar dos joelhos para baixo. E como não consigo equilibrar-me só numa perna, também não a consigo erguer para passar a espuminha. Não sei como vai ser, mas é mais uma preocupação para a minha mami. Anda a aguentar tudo desde 2005. Em Outubro desse ano, o meu pai teve um enfarte e foi a mãe-guerreira que aguentou e tratou de tudo. Desde esse momento foi uma catadupa de acontecimentos de saúde, que vêm cansando e cansando.
Se eu pudesse escolher, desejaria que a minha mãe ficasse boa, dormisse bem e pudesse aproveitar agora um pouco da reforma. A sério que não é egoísmo tipo: se ela ficar bem, trata de mim e do meu pai. Não, não é isso. O meu pai está controlado com o desfibrilhador, pode fazer uma vida normal de aposentado viajante e apreciador de novas culturas e costumes. Isso está a fazer-lhes falta.
Eu sou a empata, e devia ser a rectaguarda, quem ia regar as plantas, certo?
Que merda de voltas dá este mundo!




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2 comentários:

Unknown disse...

MAS QUE ACTIVIDADE HÁ POR AQUI?TRES EM UM MUITO BEM SIM SENHOR...
A reparaçâo está a dar frutos..
bom fim de semana e boa estadia na oficina ,ok?
abraço
jorge

Branca disse...

Olá querida,

Adorei o quintal dos teus pais, fez-me lembrar o dos meus, tinhamos muitos galinácios e árvores de fruta.
Li tudo e acho muito interessante que faças este diário. Sempre gostei de te ler e do teu humor. Cheguei atrasadita a este post, mas percebes porquê se fores ao Giórgio e até ficas a conhecer-me.
Espero que adivinhes quem sou no meio dos outros.Não te assustes,eheheh!
Andei desde terça-feira para te perguntar directamente novidades, mas já estão aqui todas e tal como te disse há tempos que as coisas iam melhorar e passaste a dar os teus passinhos, agora também te digo que continues a ter fé, sei o que digo, tenho por aqui uma ex-colega que teve uma situação muito parecida com a tua durante anos, de cadeira de rodas, que mal usaste, mas ela muito, passou a colete e ajuda de canadianas e agora se a vires não dizes o que teve. Há dias encontrei-a num centro comercial, linda, durante todo esse processo casou segunda vez, tem uma filha bonita como ela e tu também odes sempre ter os teus rapazolas, há muitos por aí à espera de uma mãe. Por a vida ser dura não se acabam os sonhos, temos que ser mais teimosos que ela,eheheh.
Beijinhos da tia muito amiga.
Branca